Na escola sempre fui aquele cara bonzinho com quem as meninas gostavam de compartilhar suas agruras amorosas. Ouvia com atenção e dava conselhos, mesmo sabendo que meus conselhos não valeriam de nada, já que me faltavam vivências amorosas com as quais pudesse compartilhar os ensinamentos delas provenientes. Serviam, talvez, apenas para confortar jovens corações femininos em conflito.
Obviamente, nesta posição, não comia ninguém. As poucas oportunidades que tive foram desperdiçadas diante minha timidez, minha falta de iniciativa em segurar a mão da moça que por algum motivo nutria algum tipo de sentimento que ultrapassasse a barreira da amizade. Com a experiência de hoje, percebo que deixei passar excelentes oportunidades, mas, enfim, eu era o bonzinho, o gente boa.
Minha vida melhorou um pouco depois que entrei para o teatro, mas esse curto período de experiências tresloucadas durou pouco, já que logo entrei num relacionamento sério e tradicional. Não estou reclamando, de forma alguma, disso em nada me arrependo.
A questão é que o bonzinho sempre se fode. Sempre entra na friend zone. Ao perceber isso, iniciei um processo de transformação, do gente boa para o canalha. Este foi meu desejo de ano novo algumas vezes.
Eis que agora, depois dos 30, começo a perceber traços 'canalhistas' no meu caráter. Tímidos traços, é verdade, mas que me deixam orgulhoso, ainda mais se acrescentados das minhas mais recentes transformações.
Estou temporariamente deixando o Falta Eu Acordar. Me dedico, agora, ao Um Amor de Bicicleta, uma história fictícia sobre um cara que procura uma namorada que goste de pedalar, ainda em fase experimental.
A arte sempre existiu para ajudar as pessoas. Ela diverte, estimula a reflexão, consola, transforma. Deve se fazer presente diariamente, mas em alguns momentos da vida temos ainda mais a necessidade de sua presença.
A música deve ser a manifestação artística mais consumida no mundo. Engraçado como podemos pontuar a vida com alguma canção, feita por alguém que já passou exatamente pelo que passamos, principalmente na área afetiva. Ouço pouca música, mas recentemente resolvi colocar algumas no celular para ouvir pelos caminhos. Nada meloso, pelo contrário, tudo que eu queria era fugir do sentimentalismo e me relacionar com coisas que me afastassem de temas relacionados ao amor. Coloquei Matanza, uma banda de Hard Core com letras extremamente violentas e machistas, mas....
Mas até os machões sofrem de amor. Sem esperar, ouvi no Matanza uma linda declaração de amor:
Quero que a estrada venha sempre até você e que o vento esteja sempre a seu favor
Eu, que faço das pedaladas mais que um exercício físico e um meio de transporte, que faço disso um estilo de vida, sei a importância não apenas das estradas, mas do vento a favor. Quando pedalamos na mesma direção do vento, fazemos menos esforço e podemos apreciar ainda mais o caminho. Ter o vento sempre a favor é ótimo, o problema é quando precisamos voltar.
Arrependimentos na vida são constantes, e eventualmente tomamos um caminho que não era bem aquele que acreditávamos ser o melhor. Nestas ocasiões precisamos retornar, e o vento a favor imediatamente se torna vento contra. Nada impossível de resolver, só requer um pouco mais de força e a cabeça levemente abaixada para não entrar areia nos olhos.
Quero que haja sempre uma cerveja em sua mão e que esteja ao seu lado seu grande amor
Acho que a estrofe acima reflete bem, para mim, o que é felicidade. Não existe coisa melhor que passar a noite com a pessoa amada numa mesa de boteco conversando e bebendo uma boa cerveja gelada.
Mas se faltar a pessoa amada, pelo menos sempre haverá a cerveja.